Em um trecho da música Não há estrelas no céu, do célebre cantor português Rui Veloso, ele afirma: “Por mais amigos que tenha, sinto-me sempre sozinho”. Será isso verdade? Não sei quanto a vocês, mas decidi formar ideias sobre o assunto.
Desconheço se é unânime, mas nunca estiveste rodeado de muitas pessoas, porém, mesmo assim, continuaste a sentires-te sozinho? Por outro lado, quantas vezes, eu, tu e outros teremos saído por aí sem travões, em busca de relações sexuais, e no final sentimos aquele vazio enorme, que acreditávamos que fosse desaparecer?
É! Realmente isso acontece com mais frequência do que possamos imaginar. Talvez, porque a maioria de nós desconheça o verdadeiro sentido de “carência”, visto que o conceito apresenta-se de muitas formas (carência económica, legal, moral, etc.). Portanto, vamo-nos ater à conceção que nos interessa: a do campo de ação da Psicologia. Buscaremos, paralelamente, os significados das palavras “afetiva” e “sexual”.
O termo “carência” vem do latim vulgar carentia. Significa “falta de algo necessário”, “privação”, “necessidade”.
Com relação à origem da palavra “afetiva”, sabe-se que parte do latim affectivu, relativo a afeto (do latim affectus), tendo como aceção “afeição por alguém”, “inclinação”, “simpatia”, “amizade”. É um estado emocional ligado à realização de um impulso que, reprimido, pode transformar-se em angústia.
Caminhemos agora para o conceito do vocábulo “sexual”, que nada mais é do que um adjetivo relativo ao sexo. Etimologicamente, deriva do latim sexu, podendo apresentar diversos significados: desde a diferença física ou a conformação especial que distingue o macho da fêmea – conjunto de indivíduos que tem o mesmo sexo –, quanto referir-se à relação sexual em si (coito, cópula). Este último sentido é o que nos desperta a curiosidade.
Que tal uma pequena junção de conceitos?
A carência afetiva pode ser interpretada como uma necessidade de afeto, simpatia, amizade. Por isso, pode resultar na necessidade de um relacionamento com outrem. No entanto, não implica obrigatoriamente num relacionamento sexual. Em contrapartida, a carência sexual é a necessidade da realização do coito; ou, se preferirem, da cópula carnal; da união sexual.
Agora, pergunto: qual das duas carências é a mais fácil de ser suprida? A afetiva é intrínseca ao ser humano seja pela solidão circunstancial, seja pela sentida na infância. Desse modo, é muito mais difícil, por vezes quase impossível, de ser resolvida. Daí, aquela frivolidade após o coito; ou mesmo, a sensação de se estar só, em meio à multidão. Já a privação sexual é de solução bem mais simples e acessível. Até sem sair de casa, pode ser atendida.
Em vista dos conceitos acima, é possível pôr fim à distorção de significados, que nos tem atordoado durante muito tempo. Assim sendo, agora que tu te encontras um pouco mais munido, do que no início do texto, espero que consigas distinguir com clareza qual carência te assombra (ou não).
Pensa de forma racional, antes de saíres por aí de maneira imoderada, à procura de alguém ou algo para acabar com a tua carentia. Imagina: se a tua carência não for nem de caráter afetivo nem sexual, mas sim, financeiro, sair para “beber até cair” em bar ou ir para uma discoteca à procura de “alguém”, só vai aumentá-la ainda mais. E tu não queres isso, pois não? Então reflete, reflete e reflete. Tentarei fazer o mesmo, sempre que me sentir carente.