A expressão coração partido é trivial para aqueles que sofrem, já sofreram ou até mesmo sofrerão desilusões amorosas (ninguém está livre disso). Portanto, todos nós já dissemos, pensamos, ou ouvimos incessantemente fulano dizer que “está de coração partido” ou que “sicrano partiu o meu coração em pedaços”.
Após escutar vezes sem fim tais expressões, decidi perguntar porquê. Porque o coração é o órgão eternamente ligado ao amor? Por certo, ninguém associaria o amor a um órgão qualquer, como o intestino, por exemplo, cuja função está vinculada à eliminação das fezes. Porém, porque não unir o amor ao cérebro?
Por outro lado, não pensemos que a aliança seja recente. Nas culturas mais antigas, o coração já se encontrava ligado às situações de cunho emocional, pois além de não conhecerem a função do cérebro, o coração era o único órgão cujo funcionamento variava de acordo com as emoções. Os antigos romanos tinham a certeza de que a memória tinha assento no coração. Da mesma forma que os hebreus pensavam que a consciência estivesse nos rins. Maravilha não? Continuando, que tal fazermos uma comparação entre o coração e a mente, para mais esclarecimentos?
O “coração” é um vocábulo de etimologia incerta. Do latim cor, cordis, desenvolve-se para cordial, acordar, discordar, recordar, recurso, coragem e misericórdia. Aliás, “recordar” é fazer passar novamente pelo cor. Por outra parte, do grego kardia desenvolve-se para cardíaco, cardiograma, endocárdio, pericárdio e outros termos médicos.
Metaforicamente, pode ser considerado como a sede dos sentimentos, das emoções, até mesmo da consciência; mas, apenas de forma figurada. Quanto à anatomia, o coração é um músculo oco; o órgão central do sistema circulatório, sendo responsável pelo percurso do sangue bombeado através de todo organismo.
Por sua vez, a palavra “mente” vem do latim mente, de mens, “espirito”, “intelecto”, “pensamento”, “entendimento”. Em lato sensu, seria o estado da consciência ou subconsciência, relativo ao conjunto de pensamentos.
De acordo com a jornalista norte-americana, especializada em ciência, Sharon Begley “O cérebro é a estrutura física, o pouco mais de 1 quilo de tecido biológico dentro da cabeça. A mente é o resultado do funcionamento do cérebro: os pensamentos, os sentimentos e as emoções”.
Já para o dicionário técnico de psicologia de Álvaro e Nick (1979), mente “é o sistema total dos processos mentais ou atividades psíquicas de um indivíduo”.
Observando e comparando os conceitos acima, faz-se perceptível que o “amor” existe na nossa mente; não, no nosso coração. Tudo bem, todos sabemos: sempre que estamos dominados por uma forte emoção, como de amor e prazer, os batimentos cardíacos se alteram. No entanto, isso não significa que o coração seja a sede do amor. Se pensarmos assim, qualquer dia aliaremos o amor aos genitais, não? Afinal, os genitais também passam por alterações em decorrência das excitações provocadas pelo sentimento.
Por fim, investigadores da Universidade da Flórida, nos EUA, especialistas em neurociências, conseguiram provar que o amor está no cérebro e não no coração. E, segundo alguns pesquisadores, em breve será possível treinar o cérebro para aumentar a felicidade e a compaixão.
O que me intriga é: porque nós, em pleno século 21, acostumados com novas descobertas, insistimos em utilizar conceitos, mantidos durante séculos como únicos, que não correspondem à realidade? Porque não dizer que “fulano partiu a minha mente” ou que “sicrano deixou a minha mente em pedaços”? Que tal um pouco de realidade? Então, paremos de acusar o pobre coração, cuja função é limitada, valorizando mais a nossa mente.